Artigo – Entre a fé e a urna: o Brasil ainda espera um salvador?

Na tradição cristã, a Semana Santa é um tempo de silêncio e contemplação. Um convite à introspecção sobre os valores que sustentam a fé, mas também sobre aqueles que deveriam sustentar a vida em sociedade. 

Segundo as Sagradas Escrituras, Deus enviou seu Filho ao mundo não com coroas ou espadas, mas com a simplicidade dos que servem. Jesus Cristo veio para libertar a humanidade do egoísmo, da opressão e da mentira. Sua missão não foi instaurar um império, mas abrir caminho para uma nova consciência.

Dois milênios se passaram, mas a essência desse enredo parece ainda habitar o imaginário coletivo do povo brasileiro que, diante da frustração com a política, clama por um novo enviado. No Brasil, em especial, o apelo ao “salvador da pátria” se repete com uma constância inquietante. 

Em tempos de desilusão, buscamos líderes que prometem muito e explicam pouco. Que seduzem com a facilidade do discurso e empolgam com a fantasia da solução imediata. A esperança, tantas vezes legítima, acaba sequestrada por narrativas que confundem fé com fanatismo, autoridade com autoritarismo, carisma e populismo com competência.

Ao longo da história recente do Brasil, não faltaram vozes que prometeram “varrer a corrupção”, “caçar os marajás”, “acabar com a fome e a pobreza” ou “mudar tudo que está aí”. São slogans que mobilizam pelo apelo emocional, mas que, sem ações concretas, se revelam apenas retórica vazia. Como já advertia o apóstolo Tiago, “a fé sem obras é morta” e o mesmo se aplica à política: um plano de governo sem execução é apenas papel. 

O Brasil não precisa de salvadores da pátria, mas de projetos consistentes nas áreas de economia, infraestrutura, educação e gestão pública. Precisa de líderes comprometidos com resultados, não de figuras que buscam aplauso por cumprir obrigações institucionais. É tempo de substituir promessas por entregas, discursos por responsabilidade e vaidade por serviço público.

No fim, tudo passa por uma questão de escolhas e da forma como conduzimos nosso processo eleitoral. É difícil acreditar, com honestidade, que em apenas 45 dias de campanha seja possível conhecer verdadeiramente os candidatos, avaliar propostas viáveis e refletir sobre o futuro do país. 

A forma como se distribuem os recursos públicos, o tempo de rádio e televisão entre os partidos e o próprio modelo de campanha precisam ser repensados com urgência. Jesus não foi condenado pelo que fazia, mas pelo que pregava pela libertação, pela possibilidade de uma nova ordem. Da mesma forma, hoje, novas lideranças não surgem porque a estrutura de poder não permite. Há muita gente preparada, séria, comprometida, mas sem espaço. 

Ainda hoje, temos muitos Barrabás disfarçados de salvadores da pátria figuras que se alimentam da desesperança do povo e se apresentam como solução, mas apenas perpetuam o ciclo de frustração e retrocesso. 

Afinal, a história se repete, e tudo se resume a uma questão de escolha. Enquanto o povo não compreender a real importância do voto e não fizer suas escolhas de forma livre, consciente e responsável, continuaremos a carregar a cruz de um país marcado pela desigualdade, pela exclusão e pela falta de justiça social. Que, neste tempo de reflexão, possamos resgatar os verdadeiros valores cristãos como solidariedade, humildade, compaixão e justiça para que, juntos, possamos construir um Brasil mais justo, ético e verdadeiramente inclusivo.

Sobre o autor

Wesley Araújo é advogado, especialista em Direito Constitucional e Direito Eleitoral, atualmente mestrando em Direitos Humanos. Além de sua destacada atuação na advocacia, é também radialista e palestrante reconhecido na área de comunicação assertiva, onde desenvolve treinamentos, palestras e cursos voltados ao aprimoramento da comunicação pessoal e profissional. Atua como comentarista jurídico e político, unindo sua sólida formação acadêmica à habilidade prática de traduzir temas complexos para uma linguagem clara, objetiva e acessível ao grande público.

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