Artigo – O poder dos influenciadores digitais e os desafios da liberdade de expressão nas eleições

Foto: TSE

É inegável que a internet assumiu papel central no processo eleitoral contemporâneo. Desde as eleições de 2018, o ambiente virtual passou a ser o novo palanque político. Os comícios físicos, antes marcados pela presença popular nas praças, foram substituídos pelas plataformas digitais e, nelas, pelas contas pessoais e profissionais dos candidatos. A desenvoltura e o domínio do uso das redes sociais tornaram-se elementos decisivos para a conquista de visibilidade e engajamento. Quem compreende a linguagem digital e sabe utilizá-la estrategicamente possui hoje um diferencial eleitoral inquestionável.

As redes sociais consolidaram-se como o principal canal de conexão entre o eleitor e o candidato, o espaço em que se constroem identidades políticas, se difundem ideias e se moldam percepções. É nesse território simbólico que o eleitor estabelece vínculos emocionais e cognitivos com as propostas e personalidades dos postulantes. Em síntese, a arena virtual converteu-se no mais influente instrumento de persuasão política do século XXI.

Contudo, diante dessa relevância, emerge uma indagação necessária: quais limites devem ser impostos àqueles que detêm um poder comunicativo extraordinário os influenciadores digitais? Esses agentes da comunicação moderna não apenas se expressam; eles mobilizam massas, orientam comportamentos e, muitas vezes, definem tendências de opinião.

A legislação eleitoral vigente, ao vedar a propaganda paga na internet e o impulsionamento de conteúdo patrocinado por terceiros, busca preservar a paridade de armas entre os candidatos. Todavia, permite que os influenciadores manifestem, em seus perfis pessoais, suas preferências políticas, sob o argumento da liberdade de expressão.Ocorre que essa fronteira é tênue e de difícil fiscalização. Na prática, é quase impossível mensurar se houve ou não contraprestação financeira pela manifestação do influenciador, tampouco avaliar o real impacto de sua influência no processo eleitoral. A ausência de mecanismos de controle efetivo gera um vácuo normativo perigoso, capaz de comprometer o princípio da igualdade entre os concorrentes.

As contas desses influenciadores, embora formalmente pessoais, funcionam, na realidade, como empresas digitais, com alcance milionário e valor de mercado mensurável. Cada publicação, portanto, carrega um peso econômico e simbólico que ultrapassa o direito individual de manifestação: trata-se de um ativo publicitário com potencial de desequilibrar o pleito. A atuação desregulada desses perfis equivale, por analogia, à intervenção de uma empresa privada no processo eleitoral situação expressamente vedada pela legislação brasileira.

Surge, então, o dilema jurídico: como compatibilizar a liberdade de expressão com a necessidade de equilíbrio eleitoral? Não se trata de suprimir o direito de opinião, mas de reconhecer que, quando o exercício dessa liberdade se dá dentro de estruturas profissionais e de monetização, ele deixa de ser estritamente pessoal e passa a assumir contornos empresariais e, portanto, políticos.

O desafio é encontrar o ponto de equilíbrio. Um caminho possível seria permitir a manifestação individual do influenciador, mas limitar o número de publicações ou o uso reiterado de sua plataforma durante o período eleitoral. Tal medida preservaria sua liberdade de expressão, sem comprometer a lisura e a igualdade da disputa.

Diante do crescente poder de alcance e persuasão das plataformas digitais, impõe-se a necessidade de repensar os limites e a responsabilidade dos influenciadores digitais no contexto eleitoral. Esses agentes, ao atuarem como verdadeiros vetores de formação de opinião, podem impactar significativamente a livre manifestação do voto e a igualdade de oportunidades entre os candidatos. Assim, torna-se imprescindível estabelecer parâmetros normativos e mecanismos de controle que assegurem a liberdade de expressão sem permitir que ela se converta em instrumento de manipulação política ou em meio de distorção do processo democrático.

Em tempos em que as redes sociais definem rumos políticos, é imperioso repensar a fronteira entre o discurso pessoal e o discurso empresarial. A democracia digital exige não apenas liberdade, mas também responsabilidade e equidade. Sem isso, o poder do algoritmo e da influência individual poderá transformar a livre escolha do eleitor em produto de marketing e não em exercício consciente da cidadania.

Sobre o autor

Wesley Araújo é advogado, especialista em Direito Constitucional e Direito Eleitoral, atualmente mestrando em Direitos Humanos. Além de sua destacada atuação na advocacia, é também radialista e palestrante reconhecido na área de comunicação assertiva, onde desenvolve treinamentos, palestras e cursos voltados ao aprimoramento da comunicação pessoal e profissional. Atua como comentarista jurídico e político, unindo sua sólida formação acadêmica à habilidade prática de traduzir temas complexos para uma linguagem clara, objetiva e acessível ao grande público.

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