A escolha do nome do Papa simboliza muito mais do que uma simples tradição. Ao adotar um novo nome, o pontífice revela ao mundo o espírito e as prioridades que pretende imprimir ao seu pontificado. Quando Jorge Bergoglio se apresentou como Papa Francisco, a mensagem foi clara e, ao mesmo tempo, paradoxal: ao homenagear São Francisco de Assis, evocou a imagem de um santo que, embora tenha sido pregador da paz, e do amor aos marginalizados, também foi um revolucionário em sua época, ao romper com privilégios e desafiar estruturas da Igreja.
Papa Francisco, ao assumir esse nome, trouxe para o centro do debate e da ação da Igreja esse duplo legado: a coragem de promover mudanças profundas, desafiando tradições e estruturas, mas sempre pela via do diálogo e da busca por conciliação. Assim como o santo de Assis, o Papa buscou renovar a Igreja, ao mesmo tempo em que reafirma o valor do acolhimento e da tolerância com os mais vulneráveis. O nome Francisco, portanto, carregou a síntese dessa dualidade: evolução e paz, ruptura e reconciliação.
Assim como Francisco de Assis, Jorge Bergoglio, antes de se tornar Papa, também se viu envolvido, ainda que de forma indireta, nas complexas relações entre Igreja e política na Argentina, sua terra natal. Sem jamais se alinhar a uma bandeira partidária, Bergoglio assumiu posicionamentos e discursos que, por vezes, desagradam tanto à direita quanto à esquerda, sendo taxado como opositor conforme a conveniência de quem o criticava.
Contudo, nunca fugiu ao debate quando o propósito era defender a justiça social e levar a palavra de Deus, sempre colocando a dignidade dos mais pobres e marginalizados no centro de sua missão. Seu compromisso com a paz social e a inclusão ecoa o exemplo revolucionário e pacificador de São Francisco de Assis, mostrando que é possível promover mudanças profundas sem abrir mão do diálogo e da fraternidade.
Um paralelo que podemos traçar com toda essa história é lembrar que Francisco influenciou a vida política de seu país, mesmo na condição de religioso, sem buscar protagonismo e sem interesses pessoais. Infelizmente, no Brasil, hoje assistimos a algumas denominações religiosas atuando não em favor da paz e da justiça social, mas movidas pelo oportunismo. Essas lideranças acabam ludibriando e confundindo o povo, comportando-se como verdadeiros fariseus “sepulcros caiados, bonitos por fora e sujos por dentro”, como disse o evangelista.
Curiosamente, durante seus doze anos de pontificado, o Papa Francisco nunca esteve na Argentina. Não por omissão, mas porque sempre deixou claro que seu interesse jamais foi a política partidária. Seu maior exemplo para a classe política foi mostrar que o verdadeiro papel de quem detém poder não é exercer o domínio, mas servir ao povo e trabalhar por uma sociedade mais justa.
Mas qual foi o maior legado deixado pelo Papa Francisco? Foram várias as suas contribuições religiosas e políticas, mas quero destacar uma em particular. Francisco nos ensinou que não basta não fazer o mal; é preciso ousar fazer o bem. Esse foi o grande ensinamento do Santo de Assis, que se espelhou no próprio Cristo.
Um exemplo claro disso foi quando abençoou casais homossexuais. Esse gesto mostrou ao mundo que não basta apenas não os condenar, mas sim dar um passo firme em direção ao acolhimento. Ou seja, não bastava ser um defensor das minorias: era preciso chamar a atenção da Igreja Católica para diversas problemáticas institucionais e dogmáticas, que precisam ser debatidas e analisadas à luz do olhar cristão.
Francisco se fez instrumento de paz justamente porque ousou tocar nas estruturas rígidas da Igreja Católica — não como um furacão que devasta, mas como uma brisa suave que, ao passar, transforma tudo ao seu redor sem destruir. Sua força não esteve na imposição, mas na delicadeza de quem compreende que as verdadeiras mudanças acontecem quando se inspira, acolhe e convida ao diálogo.
Por isso, a Igreja Católica jamais será a mesma após Francisco. Sua mensagem permanece como um chamado para sermos pessoas melhores. Francisco nunca quis mudar o mundo de forma grandiosa, mas buscou nos alertar de que podemos e devemos ser mais sensíveis e humanos em nossas atitudes. O mundo que desejamos construir depende das pequenas escolhas que deixamos de fazer; afinal, a omissão é, talvez, o mais grave dos pecados.
E você, tem praticado o bem ou se contenta apenas em não fazer o mal?
Sobre o autor

Wesley Araújo é advogado, especialista em Direito Constitucional e Direito Eleitoral, atualmente mestrando em Direitos Humanos. Além de sua destacada atuação na advocacia, é também radialista e palestrante reconhecido na área de comunicação assertiva, onde desenvolve treinamentos, palestras e cursos voltados ao aprimoramento da comunicação pessoal e profissional. Atua como comentarista jurídico e político, unindo sua sólida formação acadêmica à habilidade prática de traduzir temas complexos para uma linguagem clara, objetiva e acessível ao grande público.